AQUI VOS FALA Henrique Sebastião. Eu custei a me aperceber da repercussão causada pela campanha de lançamento do livro “Os Erros do Catecismo Moderno”, de Michael Haynes. Foi a pergunta de um aluno de nossa Formação Teológica que me fez proceder a uma breve pesquisa e ver que estão pipocando respostas indignadas à iniciativa do Centro Dom Bosco (CDB).
Bernardo Küster, Pe. José Eduardo e mais um monte de gente ficou muito irritada com isso… Penso que talvez a reação tenha se dado mais fortemente por conta do momento que vivemos, com a eleição recente de Leão XIV. Com os verdadeiros absurdos de Francisco, estavam todos aceitando críticas, mas com a chegada do novo Papa, a esperança se reacendeu e agora todos voltam a acreditar num renascimento, numa recuperação das tradições, uma restauração da liturgia, um resgate dos bons costumes… É um momento difícil para criticar, mais propício para buscar a união.
Claro, é sempre uma coisa extremamente complicada esse negócio de leigo querendo ensinar os bispos e o próprio papa sobre a ortodoxia da Doutrina. Como Francisco dizia e fazia barbaridades, a situação era outra, mas agora tudo mudou. Este é um ponto.
Sobre o livro em questão, o que posso dizer é que seu autor, o Michael Haynes, é um jornalista e autor católico muito bem formado e respeitável, eu leio seus artigos há anos e tenho confiança de que o trabalho dele é embasado. Também não tenho dúvidas de que o catecismo amarelo tem problemas graves e mesmo que contém erros, sendo o principal deles a linguagem dúbia, a margem que sempre deixa para interpretações esdrúxulas, como não deveria nem poderia ser em se tratando justamente de um catecismo, que por definição tem que ser objetivo e totalmente claro em tudo o que ensina. Mas não quero focar nisso agora, já que o meu ponto é outro.
No debate em questão, inclusive no que surgiu no grupo que administro, eu vejo claramente delineados os pensamentos dos dois grupos que dominam a discussão sobre a situação da Igreja, hoje, partindo daqueles que reconhecem que há uma grave crise (excluídos, portanto, os ‘progressistas’).
É justamente a essa divisão que eu me refiro como o problema mais importante a ser sanado, se quisermos voltar a ter aquela tão essencial unidade da Igreja, ao menos em seu sentido pleno.
Claro, do outro lado temos todos os “outros”: aqueles que podemos chamar de “progressistas” e também de “modernistas”, “revolucionários” ou meros católicos “jujuba”, e ainda os famosos “católicos do IBGE”. São os que simplesmente não têm fé católica de fato, e menos ainda têm zelo pela Casa de Deus, além das muitas pessoas simples que não são capazes de entender a gravidade do problema (e assim, são facilmente desviadas pelos lobos infiltrados) e outros que só estão na Igreja por uma questão de convenção ou outro motivo superficial qualquer.
Infelizmente, o grupo dos que não têm fé e que, portanto, simplesmente não se importam, representa a maioria. E, mais infelizmente ainda, o outro grupo, o dos que se importam, porque têm fé católica verdadeira, está cindido em dois, como já disse.
Assim, temos os chamados “conservadores”, que reconhecem que estamos vivendo uma crise, que se escandalizam quando um bom católico deve mesmo se escandalizar, mas que adotam uma posição de muita prudência, buscando sempre uma “interpretação católica” para tudo o que vêm ocorrendo na Igreja desde o concílio Vaticano II, a começar pelos próprios documentos do Concílio (podemos ouvir o padre Paulo Ricardo falando, aqui). Eles entendem que, mesmo que o próprio Papa diga e faça os piores absurdos, mesmo que ele incorra em heresia com pertinácia, mesmo se ele ensinar o erro a toda a Igreja, colocando em risco as almas dos fiéis, de qualquer jeito temos que reconhecê-lo, honrá-lo e respeitá-lo como o Papa, já que ninguém tem poder ou autoridade para questionar ou se pronunciar publicamente a respeito. Podemos “resistir” apenas em âmbito particular, não obedecendo àquilo que ele ensine ou decida, se claramente contrariar o dogma da Fé, a doutrina dos Apóstolos e dos Papas santos, mas jamais podemos nos pronunciar publicamente. Os adeptos desta posição apelam sempre para exemplos de Santos que, mesmo contrariados, submeteram-se à autoridade dos Papas.
Se quiserem saber a minha posição a respeito desse gigantesco problema, a verdade é que eu tenho me debatido entre posições há anos, desde que comecei a me dedicar ao estudo mais aprofundado das muitas questões que ele envolve. Vejo razões e boas fundamentações em ambas as partes. Concordo com os dois lados em determinados pontos, mas preciso ser honesto e confessar que, até hoje, não consegui consolidar uma opinião rígida a respeito, como gostaria. Também conheci e empreendi longas conversas com sedevacantistas, tanto do ramo totalitário quanto sedeprivacionistas, e vi que estes últimos também têm sólidas razões para defender a sua posição mais radical. De fato, a minha inclinação é crer que os últimos papas perderam a sua autoridade espiritual sobre a Igreja, ainda que mantenham a autoridade em sentido material. São papas? Sim, são os papas da igreja do Vaticano II. O que isso quer dizer? Rezemos, rezemos e esperemos a intervenção divina para por fim a toda esta confusão…
O fato é que eu tenho suspendido o meu juízo, há anos, suplicando a Deus incessantemente e oferecendo minhas dores pela restauração da santa Igreja.
Do que está sendo discutido e que vem sempre à tona, como agora, com o lançamento do livro que aponta os erres do Catecismo amarelo, só quero pontuar que é muito importante que os apostolados, especialmente leigos, tenham cuidado com as almas mais simples. Houve um momento em que eu mesmo assumia uma postura mais agressiva e muito combativa, aqui, porque me revirava o estômago ver um papa ensinando — abertamente e com pertinácia —, grosseiras heresias, com potencial de levar almas para o Inferno (o que não é possível segundo o dogma, diga-se de passagem). Mas, com o tempo, percebi que isso era inútil, porque muitos simplesmente não aceitam, recusam-se a encarar os fatos e se fecham obstinadamente para a realidade objetiva. Estes imaginam que a solução é atirar no mensageiro. Se eu cito um fato, sou eu o culpado, porque estou “falando mal do papa” e estou “causando divisão”. Por amor a estas almas e temor de Deus, amenizei o meu tom e tenho tomado mais cuidado.
Por outro lado, é curioso notar que o próprio Código de Direito Canônico atual garante aos leigos o direito de se manifestarem publicamente e, mais do que isso, até lhes imputa o dever de fazê-lo:
“§2. Os fiéis, conscientes da sua responsabilidade, têm o direito de manifestar aos pastores da igreja as próprias necessidades, principalmente espirituais, e os próprios anseios.“§3. De acordo com a ciência, a competência e o prestígio de que gozam, têm os leigos o direito e, às vezes, até o dever de manifestar aos pastores sagrados a própria opinião sobre o que afeta o bem da igreja e, ressalvando a integridade da fé e dos costumes e a reverência para com os pastores, levando em conta a utilidade comum e a dignidade das pessoas, que deem a conhecer essa sua opinião também aos outros fiéis.
(Peso do CDC 212)
Alguns acusam o CDB de “surfar” na crise da Igreja para fazer marketing e vender livros. Eu penso que, ao menos na maioria dos casos, eles estão certos nas suas posições, mas às vezes também vejo uma soberba problemática, e me parece que se excedem em alguns pontos. Todo diretor de apostolado precisa ter em alta conta o risco de fazer perder almas, e isso pode acontecer por um desleixo na forma de dizer as coisas, de dar uma notícia, mesmo que verdadeira. Muitos simplesmente não estão preparados para isso e podem até perder a Fé com os escândalos.
Mesmo assim, se a oposição que eles (e muitos outros) têm feito representa um mal para a Igreja, então eu tenho que dizer que esse é um mal necessário. Diante do que está acontecendo, não há como não surgirem reações desse tipo, porque se os príncipes da Igreja se calam, então “as pedras clamarão” (Lc 19,40).
A verdade deve ser dita e proclamada, do alto dos telhados (Lc 12,3; Mt 10,27), e se aqueles que foram incumbidos dessa missão se acovardam e se escondem, então o servo mais indigno terá que se encarregar dela.
O glorioso São Miguel Arcanjo, de origem, não era um Anjo de primeiro escalão, mas por sua fidelidade mediante a traição do poderosíssimo Lúcifer (que devia ‘portar e ostentar a Luz’, mas preferiu a desobediência), tornou-se o grande Príncipe das milícias celestes.